É dever de todos acolher bem todas e quaisquer pessoas, independentemente de classe social, raça, gênero, status profissional ou diferenças de subjetividade. Isto se estende ao mundo dos animais domésticos e selvagens, bem como às coisas materiais. A má acolhida resulta, muitas vezes, em acidentes ou transtornos ao longo do caminho. 

É próprio do ser humano acolher. De forma especial, isso é ser humano. É sagrado, em nossas casas, um ambiente próprio para acolher as pessoas. Nesses ambientes, sempre há o convite para o cafezinho, almoço ou jantar. A acolhida, a boa acolhida, é marca forte numa família, que jamais quer deixar o visitante partir com alguma sensação de desconforto.

Mesmo nos ambientes fora do nosso lar, nas áreas comuns dos condomínios, nos corredores de fábricas, nos escritórios, crescemos com o hábito de desejar sempre um bom dia, boa tarde ou noite, por vezes acompanhado de um abraço e um ou três beijinhos a depender da região do país. Esses gestos, conforme a organização a que se pertença, se traduzem em diferentes outras formas, mas todas trazendo sempre a delicadeza do querer bem de uns aos outros.

Todas essas realidades fazem parte dos costumes das pessoas nos diferentes convívios, nos diferentes locais de encontro, e comprovam nosso desejo de dar e receber uma boa acolhida. As pessoas que prezam boas acolhidas são as de princípios e valores humanos.

Tais comportamentos geram vínculos, fazendo surgir as chamadas comunidades, que podem ser entendidas como conjuntos de famílias que compartilham os mesmos costumes, princípios e valores. Dessa compreensão, entramos na dimensão do sagrado, o espaço de Deus, e entendemos a acolhida da parte de Deus.

E a partir do olhar de Deus, o povo se organiza em comunidades religiosas. As pessoas, numa comunidade, entendem a necessidade de buscar a Deus e falarem de forma harmoniosa a partir da voz dele. Nesse sentido, organizam espaços próprios de encontros, instituem um coordenador e estabelecem as reuniões. Celebrações religiosas passam a ser rotina, mas, sobretudo, nas solenidades de domingo e festas como prescreve a tradição do chamado “Povo de Deus”.

É fundamental, para a boa harmonia e crescimento satisfatório da comunidade religiosa, a boa acolhida. Ela se inicia com o cuidado do local, seja numa residência, num salão de alguma associação, numa comunidade rural, num condomínio urbano, seja numa capela que melhor convida para a oração, seja numa igreja do centro da cidade, a estrutura do ambiente precisa contribuir para a boa acolhida. O local precisa inspirar segurança, ser limpo, ter um bom cheiro e assentos razoavelmente confortáveis. Daí a preocupação com símbolos e ritos, doutrina que vamos encaixar no que chamamos de liturgia.

PSC

Como padre, atento à liturgia, eu não poderia deixar de exigir a boa acolhida nas celebrações, sobretudo nas missas. Lembro-me com satisfação de muitas igrejas pelas quais passei neste Brasil, como também nas minhas viagens pela Europa e na Terra Santa, origem da nossa fé cristã. Com muito carinho lembro-me das paróquias das cidades goianas de Silvânia, Gameleira de Goiás, Leopoldo de Bulhões, Bonfinópolis, Vianópolis e Passa Quatro, onde, durante seis anos, com muita intensidade, fui muito bem acolhido, seja na condição de pároco, seja na de vigário episcopal. Em tais locais, sempre houve a boa atenção com a liturgia nos espaços sagrados.

Mesmo um telespectador que liga sua tv ou acessa um site, ele entra no espaço sagrado que se faz ali virtualmente; e por sua vez, o virtual entra nas casas dos fiéis fazendo dali um único ambiente sagrado. Uma vela acesa, um copo d’água a ser abençoado e tomado após a oração, e mesmo a distribuição de algum biscoito no momento da comunhão, como já me aconteceu quando eu era criança, tudo acompanha religiosamente as orientações que chegam ali do rádio, da televisão, e, hoje, da Internet.

Aprofundando a compreensão de liturgia, ela diz respeito à leitura de todos os ritos ao longo de uma celebração, é o script, o texto a ser observado para que a celebração tenha linha, seguimento, seja de fácil entendimento e de fácil interpretação pelas pessoas envolvidas. E tudo começa pela boa acolhida.

Pela minha experiência e convicções, tudo fica muito bem numa comunidade de fé quando se tem em vista a boa acolhida, sobretudo quando se inicia com o acendimento de uma vela. A vela chama a atenção para o sagrado. Quando a celebração acontece a partir desse ponto, tudo se mostra fluindo de forma leve, bonita e bem compreendida pela assembleia orante. O ambiente se transforma, e uma vibração positiva passa a ser identificada em cada pessoa diante da vela. Deus se faz claramente presente e sentido.

Certa vez, ao iniciar uma Celebração Eucarística com os alunos do Colégio Dom Bosco, comparei a vela ao Wi-Fi. Apagada, a vela é apenas uma antena sem grande importância, mas, uma vez acesa, é como saber a senha do Wi-Fi e estabelecer muitas conexões entre amigos. A vela acesa, sobretudo no início de um momento de oração, faz com que estejamos conectados a Deus. Daí então, pela fé, tudo se transforma, todos se conectam de maneira intensa na celebração.

Uma pessoa cuja acolhida me é uma recordação muito bonita, com a qual espero inspirar vocês, é o Robertinho. Nos idos dos anos 2000, Robertinho era coordenador da capela São Geraldo, da Paróquia Cristo Luz dos Povos, em Belo Horizonte. Eu era estudante iniciante de Teologia e participava das celebrações ali aos domingos. Robertinho costumeiramente vinha até o corredor da capela acolher de forma calorosa as pessoas, chamava algumas pelo nome, lembrava ali o aniversário natalício de um, o casamento de outro, o pedido de saúde de alguém acamado em casa ou mesmo ali presente, se compadecia da perda do ente querido de alguém e, por fim, chamava a todos para o acendimento da vela, animando-os para a mesma luz do Espírito Santo. Com a vela acesa, dava-se a entrada solene da procissão com o presidente da celebração e toda a equipe litúrgica. Maravilhosa acolhida! Tudo muito rápido, alegre, espontâneo, preparado, envolvendo a todos,sem exceção.  

Outra pessoa de acolhida muito inspiradora é o Pe. Wolfgang Gruen. Em todas as celebrações que presido, sem exceção, o Pe. Gruen se faz presente em minhas lembranças, pois também ele tornou-se para mim uma referência na boa acolhida. E ele iniciava sempre com o acendimento da vela. Na comunidade de estudantes de Teologia e mesmo na comunidade de fé paroquial, ele fazia a chamada para a vela apagada comparando-a às muitas realidades apagadas em nossas vidas, na vida daqueles estudantes, daquele determinado povo, e dali convidava alguém que desejasse algo ou alguém a se apresentar com antecedência a alguma demanda especial. Essa pessoa tomava o fósforo e, solenemente, depois daquela bela motivação feita pelo Pe. Gruen,

acendia a vela, e toda a celebração se dava em torno daquela chama cerimomiosamente acesa. Tudo isto, se acompanhado de um mantra litúrgico, faz todos os presentes se arrepiarem de emoção e se sentirem tocados por Deus.

A vela acesa é sempre um sinal de acolhida. Através dela, consegue-se dar um tom diferenciado ao ambiente, chamar as pessoas para uma dada solenidade, mesmo numa mesa de jantar entre duas pessoas apaixonadas; num momento a sós em oração; no concretizar de uma promessa aos pés de uma imagem de santo; no momento fúnebre de despedida de uma pessoa; no momento de visita ao cemitério, diante do túmulo do ente querido; no pedido de paz, equilíbrio; e no altar do sacrifício, em que Jesus se faz pela comunidade de fé. A chama da vela transmite vida, carinho, ternura. Às vezes não se observa essas e outras coisas nelas mesmas, mas elas estão falando, comunicando os sentimentos da pessoa ou das pessoas ali diante dela. Caso queira solenizar um encontro extraordinário, alcançar a atenção desejada, organize um ambiente, assegure-se da boa ventilação dentro dele e acenda uma vela para que tudo ganhe a solenidade merecida conforme o que se deseja.

Pois bem, a boa acolhida é fundamental em toda a natureza e necessária para a boa convivência humana. E tudo isto, numa comunidade religiosa, onde se concentram as pessoas, as famílias, com as suas diferentes manifestações, as suas diferentes demandas, dores e alegrias, torna-se acolhida de uns aos outros diante da dimensão do sagrado, do divino  

 

Copyright: 1368244196 – https://www.shutterstock.com/pt/g/fizkes