O coração é frequentemente utilizado como um símbolo para as emoções humanas. De fato, não é tão difícil entender essa relação, afinal de contas, é comum que esse órgão acelere os batimentos diante de emoções intensas, sejam elas positivas, sejam negativas.

No entanto, mais do que uma linguagem metafórica, as relações entre o coração e as emoções alcançam o universo da medicina. Assim, a saúde da mente e a saúde cardíaca têm mais relações do que podemos imaginar. Mas será que é possível relacionar, por exemplo, uma condição cardíaca chamada prolapso da válvula mitral aos quadros de ansiedade? Será que o nosso coração pode ser assim tão sensível às nossas emoções? Continue a leitura do artigo a seguir e saiba mais sobre o tema!

Revisando a anatomia do coração

O prolapso da válvula mitral (PVM) também é conhecido como prolapso da valva mitral ou “sopro” no coração. Trata-se de uma alteração anatômica benigna que acomete de 5% a 7% da população mundial, podendo chegar a 17% no sexo feminino.

Como se sabe, o coração possui 4 câmaras: 2 átrios e 2 ventrículos. O coração também apresenta 4 válvulas ou valvas: a válvula aórtica e a válvula Mitral, localizadas do lado esquerdo do coração, e as válvulas tricúspide e pulmonar, localizadas do lado direito do coração.

As válvulas são as estruturas localizadas na saída de cada uma das 4 câmaras cardíacas, que agem como comportas, impedindo que o sangue bombeado retorne para a câmara que o bombeou/expeliu.

A válvula mitral fica localizada entre o átrio esquerdo e o ventrículo esquerdo, e é composta por dois folhetos que se abrem como aquelas portas de saloons dos filmes de Velho Oeste.

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Quando o sangue termina de passar, esses folhetos se fecham, encostando-se firmemente um no outro para vedar completamente a passagem. Quando isso não acontece e o sangue retorna para uma das câmaras, acontece o que cientistas chamam de regurgitação ou insuficiência mitral.

O que significa o “Prolapso da Válvula Mitral (PVM)”?

O prolapso da válvula mitral é uma das causas de regurgitação mitral, pois os folhetos se empurram e não vedam completamente a passagem de sangue. Ele é um defeito congênito no tamanho dos folhetos, que faz com que a Válvula não consiga se fechar adequadamente.

Os quadros de PVM são mais comuns do que possamos imaginar. Felizmente, não apresentam consequências tão drásticas, e a grande maioria das pessoas não manifesta sintomas, apesar de poderem ser sentidos em alguns casos. São eles:

  • Dor no peito;
  • Arritmia;
  • Falta de ar;
  • Cansaço;
  • Tontura;
  • Desmaio;
  • Dormência nos membros do corpo;
  • Alterações inespecíficas do eletrocardiograma;
  • Angústia;
  • Síndrome do pânico;
  • Ansiedade;
  • Depressão;

Por não apresentar grandes riscos à vida das pessoas, geralmente os portadores de PVM vivem muito bem, mas é claro que, assim como qualquer problema de saúde, o quadro pode apresentar complicações, como embolia sistêmica, insuficiência mitral grave e endocardite infecciosa.

O tratamento recomendado para os casos de PVM são os betabloqueadores e os ansiolíticos. Apenas em alguns casos raros, em que há regurgitação mitral grave, são recomendados procedimentos cirúrgicos e a substituição da válvula.

Há relação entre o prolapso da válvula mitral e fatores emocionais, como a ansiedade?

Um dos mais comuns equívocos no diagnóstico de pessoas que procuram atendimento médico com palpitações, taquicardia e falta de ar, características de transtornos de pânico e de outros distúrbios de ansiedade, é o de associar esses sintomas ao prolapso de válvula mitral (PVM), uma anormalidade cardíaca.

A esse respeito, foi realizada uma pesquisa de mais de 5 anos na Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP. Ela foi publicada em setembro de 2011 no British Journal of Psychiatry, pelos professores José Alexandre de Souza Crippa e Benedito Carlos Maciel, e não encontrou qualquer associação entres essas condições.

Os pesquisadores utilizaram técnicas modernas de avaliação cardiológica e de diagnóstico psiquiátrico na realização dos estudos dessa pesquisa. Foram analisadas 232 pessoas, sendo 41 delas diagnosticadas com transtorno do pânico, 89 com fobia social e 102 pessoas sem transtornos da mente.

Um dos pesquisadores explicou que, se for realizada uma avaliação cardiológica mais minuciosa em pessoas que procuram os consultórios médicos com sintomas de pânico ou fobia social, provavelmente parte dessas pessoas não terá diagnóstico de PVM.

Ele explica, ainda, que, apesar disso, apenas os sintomas já são o suficiente para avaliar de forma errônea a possibilidade de um indivíduo ter problemas cardíacos. Por isso, muitas pessoas são erroneamente diagnosticadas.

Essa falha, causada pela similaridade dos sintomas de PVM com doenças emocionais, pode causar um retardamento no diagnóstico e no tratamento de transtornos de ansiedade, o que, consequentemente, aumenta a dificuldade do indivíduo em aceitar que possui um distúrbio psiquiátrico possível de ser tratado.

O professor Crippa afirma que retardar o tratamento de transtornos decorrentes da ansiedade pode levar à progressão rápida do distúrbio, sendo cada vez mais comuns e frequentes os ataques/crises, que acabam limitando a qualidade de vida da pessoa.

Além disso, podem ser desenvolvidas outras doenças psiquiátricas, como a depressão, o alcoolismo, o uso de drogas ilícitas, problemas afetivos, insegurança, ansiedade entre outras. Por essa razão, é extremamente necessário que, ao identificar qualquer alteração emocional, física ou comportamental, o indivíduo busque ajuda especializada para que sejam investigados a fundo os sintomas e as causas que os desencadearam.

Conclusão

Concluindo, podemos entender que há sintomas em comum entre alguns problemas cardíacos e os transtornos ansiosos, como palpitações, batimento acelerado e uma sensação de aperto. No entanto, essa similaridade de sintomas não significa que há uma relação entre a mente e os problemas anatômicos que podem afetar o coração, como é o caso do prolapso da válvula mitral. Dessa forma, é fundamental realizar uma avaliação médica para estabelecer o diagnóstico diferencial e iniciar o tratamento adequado à condição apresentada.

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