Você já viu como se comporta um gato quando percebe que está em um ambiente completamente novo? A tendência é que ele se esconda no lugar mais escuro e de acesso mais difícil possível e vá tentando conhecer, aos poucos, o lugar. Aos poucos ele vai se familiarizando e começa a circular livremente por ele, até chegar ao ponto de ser capaz de dormir em qualquer parte dali.
Podemos comparar o sentimento do gato logo depois da mudança com o que se chama clinicamente de ansiedade. É uma reação natural ao desconhecido, e tendemos a agir com muita cautela — às vezes até excessiva — diante do desconhecido. Há uma boa razão evolutiva para isso.
Nossos ancestrais conviviam constantemente com a possibilidade de haver um predador ou algum animal venenoso — que muitas vezes eram o mesmo bicho, como uma cobra — por todas as partes. Imagine como é o processo de descoberta que um animal desconhecido é, na verdade, um predador da sua espécie, ou que ele pode te envenenar ou mesmo, simplesmente, te picar ou morder e causar muita dor localizada.
Com o passar do tempo as espécies em geral aprenderam a ter uma reação que parece contraditória diante de algo desconhecido: ao mesmo tempo são ativados circuitos exploratórios e de autopreservação, como medo. No caso do gato, ele primeiro se esconde e, se nada mal acontecer, ele começa, devagar, o processo de exploração. Seres humanos, como têm personalidades muito distintas (não que gatos sejam todos iguais, mas nós temos cérebros mais complexos), reagem de maneiras consideravelmente diferentes.
Não obstante, prevalece entre as pessoas a tendência a considerar mais provável que o desconhecido que se manifesta para elas seja uma ameaça em vez de algo seguro. Isso porque foi, ao longo de nossa evolução, uma estratégia mais bem-sucedida ver uma ameaça onde não tem do que não ver onde tem. É mais ou menos o mesmo processo que nos levou à tendência de enxergar olhos e boca onde não há: melhor do que não enxergar onde há.
Costumamos chamar de ansiedade aquela vontade muito grande de que chegue logo a data de uma viagem, ou mesmo aquela angústia na véspera da prova que nem sabemos quanto vale. São duas manifestações diferentes diante de algo novo ou desconhecido: na primeira, predomina a propensão exploratória, e a emoção é predominantemente positiva; na segunda, vemos a prova como uma (muito) provável ameaça, com emoção predominantemente negativa.
Atualmente, não vivemos mais sob ameaça constante com predadores espreitando de todos lados. Podemos dizer que, em nosso contexto, enfrentamos apenas predadores metafóricos, que não precisam necessariamente ser pessoas, mas qualquer coisa pela qual nos sentimos ameaçados. Às vezes, algo que julgamos com ameaça é, na verdade, uma coisa que interpretamos mal; às vezes, trata-se de uma ameaça maior do que tínhamos previsto.
Algumas pessoas têm uma sensibilidade maior diante do desconhecido. Como a tendência é para a autopreservação, mas também são acionados mecanismos exploratórios, trata-se de uma situação que demanda muito do corpo. É como pisar no acelerador e no freio ao mesmo tempo. Mas o freio prevalece, e o carro não sai do lugar.
Não podemos dizer, portanto, que a ansiedade em si é uma doença. Ela é necessária e foi uma estratégia evolutiva, pelo que tudo indica, muito bem-sucedida. Temos que ter atenção, no entanto, para níveis muito altos desse sentimento, se estiver atrapalhando ou mesmo impedindo uma atitude de nossa parte diante do desconhecido.
 
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